sexta-feira, 30 de outubro de 2009

DIANTE DE PAVEL

Ontem (29/10/2009) vivenciei uma epifania.

Em meio à correria em que me encontro ultimamente, achei um tempo para ver a exposição VIRADA RUSSA - A Vanguarda na Coleção do Museu Estatal Russo de São Petersburgo, que está até o dia 15/11 no Centro Cultura Banco do Brasil.

Desde que soube da exposição, minha curiosidade em ver de perto um Kandinsky ou um Malevitch se atiçou. Mas que Kandinsky, que Malevitch que nada! A grande surpresa da exposição, para mim, foi um artista que até então eu desconhecia (as artes plásticas não são o meu forte, apesar de gostar muito de alguns artistas).

E eis que estou no terceiro andar, em meio a um aglomerado de gente (um professor de artes da UNICAMP e seus alunos) e, ao me virar para a direita, encontro-me diante de um quadro que provocou em mim uma suspensão poucas vezes experimentada. A Guerra Alemã, de Pavel Filonov.


Que mistério é esse que tem a arte, que a torna capaz de promover esse tipo de comunhão?

Sim, porque não encontro outra palavra para explicar o que eu vivenciei diante daquele quadro – eu experimentei uma comunhão espiritual imensamente poderosa com Pavel Filonov, a despeito do tempo, do espaço e da história que nos separam.

Entrei no elevador, ainda sob o impacto da Guerra Alemã, e dentro dele havia um monitor da exposição. Tamanho era o impacto em que eu me encontrava, que já não lembrava o nome do artista (minha memória para nomes, datas e fatos não é muito boa). Aproveitei sua presença e lhe perguntei. Ele me disse que havia mais quadros de PAVEL FILONOV no segundo andar. O rapaz seguiu rumo a não sei que andar e eu descí no segundo, ansioso para ver mais e mais da obra de Filonov.

As outras duas obras não eram tão fantásticas quanto A Guerra Alemã, mas eis que de repente surge o monitor ao meu lado e me diz: “Pavel Filonov morreu de fome”. Eu não consegui conter as lágrimas (assim como não consigo fazer agora, escrevendo esse artigo). O monitor sumiu – acho que foi até lá somente para me dá mais informações sobre Filonov - feliz por perceber o impacto que o artista havia causado em mim. Muito provavelmente, poucos se deram conta de tamanha “beleza”. O professor da UNICAMP, com quem conversei um pouco, me disse que seus alunos haviam comentado que a riqueza de detalhes dos quadros devia-se ao rigoroso inverno, que impossibilitava os artistas de fazerem outra coisa. Lembro que eu lhe disse que deveria ser mesmo o inverno, mas o inverno da alma o grande “culpado”.



O mais espantoso é que de alguma forma eu intuía que fisionomia, que aspecto tinha Pavel Filonov. E qual foi a minha emoção ao vê-lo no vídeo, exibido ali mesmo no segundo andar. A minha intuição se confirmara: Pavel Filonov era, estranhamente, como eu imaginava.

É muito provável que as ilustrações dos seus quadros incluídas neste post não provoquem o mesmo impacto em quem o leia. Só quem é artista, ou quem tem a alma de um, sabe o quanto colocamos de nós, de nosso espírito, em nossas obras. E penso, numa tentativa de entender o que aconteceu comigo naquele momento, que o espírto de Pavel Filonov estava ali, diante de mim, presente na sua obra.


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Pavel Filonov nasceu na Rússia em 1883 e morreu em 1941. Ele desenvolveu um sistema de arte analítica ao qual deu o nome de Florescimento Universal, que teria nascido de experimentos cubo-futuristas, aliados à arte antiga russa. Trata-se da composição de imagens diminutamente facetadas e densas, em que o particular dá vida ao geral. Para isso, ele buscava usar o menor dos pincéis e o mais fino dos lápis, criando complexos simbolismos.

Em 1923, quando Filonov era professor na Academia de Artes de São Petersburgo, ele publicou a Declaração do Florescimento Universal. Nela, ele formalizava suas ideias e teorias, representantes singulares da turbulência artística do momento.